* O Ciclo do Açúcar na Madeira

A Importância da industria do Açúcar na Madeira

Este apontamento sobre a cana-de açúcar e a industria sacarina na Madeira, é apenas e só uma breve alusão a esta actividade, sem preocupações históricas e científicas, a não ser referenciar o fenómeno, evidenciando os aspectos principais e o que decorre da nossa memória e da nossa vivência.

A importância da cana sacarina e do açúcar na Madeira foi grande no passado, levando o designado "ouro branco" - como era considerado ao tempo o açúcar - a vários cantos do mundo, sobretudo a vários países da Europa ( de que se destaca a Flandres/Bélgica), sendo que nos tempos actuais não é mais produzido açúcar - a ultima fábrica encerrou em 1986 ( Fábrica Willian Hinton), circunscrevendo-se a produção de cana-de-açúcar, actualmente, para produção de melaço de cana ( para doçaria e o famoso bolo de mel) e a produção de aguardente de cana , utilizada na tradicional poncha madeirense ( bebida tipica, que na versão mais habitual, tem algum teor alcoólico, com aguardente de cana, sumo de limão, mel de abelha)

A história da indústria do açúcar na Madeira, remonta a época da colonização e ao plantio intensivo de canaviais de cana de açúcar, sobretudo ao longo da Costa Sul.

A cana-de açúcar foi introduzida na Madeira mais precisamente em 1425.

A cana-de açúcar é originária da Àsia Oriental, chegando ao mediterrâneo através das Pérsia.

O inicio do cultivo da cana-de açúcar na Madeira através de "socas" trazidas da Sicilia (Itália), segundo consta por inciativa do Infante D. Henriques, e esta cultura teve sucesso, face à abundância de água, ao solo e ao clima.

A cana-de-açúcar é originária da Papua Nova Guiné.

A safra da cana-de-açúcar implica um ciclo produtivo que vai desde o plantio, monda, esfolhagem, combate das pragas, corte e transportes para os engenhos, onde esta é moída, para efeitos de retirar o suco ( garapa), a partir do quql é produzido o açúcar sólido, e de outros subprodutos produz-se o melaço, a aguardente de cana (Rhum) e o álcool.

A industria do açúcar conheceu períodos de apogeu, com produção significativa, decorrente da existência de muitos canaviais e muitos engenhos ( em 1494 existiam 14 engenhos ma Madeira, e o seu número atingiu mais tarde 49 unidades).

O açúcar da Madeira era um produto muito apreciado, não obstante numa primeira fase, ser de uso medicinal e farmacêutico. A primeira referência ao açúcar da Madeira data de 1433, sendo considerado um produto de excelente qualidade, por ser o mais refinado, por isso era muito procurado, atraindo mercadores estrangeiros, sobretudo flamengos, italianos e ingleses para o seu comércio, que conheceu períodos áureos de transações e contribuindo para a riqueza da Região e do Reino, pela carga tributária que implicava.

Nos primeiros engenhos e na cultura e corte da cana-de açúcar, foi utilizada mão-de-obra escrava e locais,com ganhos reduzidos e objeto de exploração, pois os ganhos desta actividade iam sobretudo para os mercadores nacionais e estrangeiros.

Segundo os historiadores, a cana-de açúcar, acompanhou a diáspora dos madeirenses, que a introduziram no Brasil, dando origem a grandes canaviais e engenhos, com aproveitamente da mão-de-obra escrava, sendo posteriormente o açúcar do Brasil um grande concorrente do açúcar da Madeira.

O ciclo do açúcar na Madeira, depois de período de properidade, findou com o encerramento, em 1986, da Fábrica William Hinton - unidade que restou das várias existentes, sobretudo pelo protecionismo que esta fábrica teve na Monarquia e no Estado Novo - e face ao contexto internacional da concorrência dos grandes países produtores de açúcar ( Brasil e Cuba) que tornavam impossível a viabilidade do açúcar da Madeira.

A Fábrica Hinton foi uma unidade de referência na produção do açúcar da Madeira, situada na cidade do Funchal, com a absorção da maioria da produção de cana-de açúcar regional, laborando continuamente na época da safra, constituindo uma imagem de marca e na memória de muitos, as imensas filas de viaturas carregadas com molhos de cana -de -açúcar, empilhados até ao topo, que estacionavam nas ruas circundantes da fábrica a aguardar descarga, uma vez que o produto tinha de ser trabalhado de imediato, pois o suco da cana-de-açúcar (garapa) não podia fermentar, para não perigar a qualidade do açúcar.

Por isso, a imagem de uma grande fábrica a laborar,na sua plenitude, com o ruído próprio das máquinas a vapor da era industrial, o aroma específico da garapa e dos produtos moídos da cana, os fumos destilados pela maquinaria, o enorme movimento de descargas de viaturas que transportavam a cana-de-açúcar, o volume significativo de operários e demais trabalhadores, envolvidos na operação, dia e noite, constituía um cenário próprio, que o tempo e a modernidade apagou, no percurso inexorável da história.

Recordamo-nos dos tempos em que a cana-de-açúcar era consumida,sobretudo pelos mais jovens, descascada, em rolos, para sugarmos o suco doce e aromático que ela vertia,no moinho único e resistente dos nossos maxilares. Então, à falta de melhor e pela carência de alternativas, este suco, pareceria néctar dos deuses, na partilha que sempre havia, de umas quantas canas de açúcar- dadas ou surripiadas - e que faziam a delicia da pequenada.

Nos dias de hoje (2017), os canaviais são reduzidos a áreas de plantação mais pequenas, os engenhos são poucos ( serão três) a industria do aproveitamento da cana-de açúca,labora a cana, apenas para produção de melaço e aguardente, tudo de forma mais reduzida e com novos métodos de trabalho, longe das imagens antigas, dos processos, do volume de trabalho e da envolvência de outros tempos.

* Rui Gonçalves da Silva - 2017