* VISCONDES DE CACONGO

Breve nota sobre a vida dos Viscondes de Cacongo ( Madeira)

No quadro dos vários apontamentos que temos elaborado, sobre algumas figuras gratas e distintas da vida sócio-cultural da Madeira, sobretudo evocando traços da vida e obra de alguns nobres que marcam, ainda nos nossos dias, a vivência  e são referências históricas, que por isso importa conhecer, pelo menos ao nível do essencial, para assim obstar a algum desconhecimento generalizado dos mesmos.

Também, como sempre cuidados de evidenciar, não se trata de estudo histórico, mas apenas e só uma alusão muito ligeira e circunstancial à vida dos mesmos, que resulta da mera compilação do material conhecido, embora disperso, para assim, dar conta do perfil e da obra das entidades em causa, contributo modesto para o seu melhor conhecimento.

O presente faz-se da história, dos que no passado marcaram o seu tempo e legaram obra para o futuro. Não podemos apenas viver o hoje, na fugacidade do presente, omitindo os que nos precederam e que, a seu modo, contribuíram para o que somos.

Assim e nessa sequência, vamos referenciar, de forma sucinta, a vida e obra dos Viscondes de Cacongo - nome que consta da toponímia da cidade do Funchal, numa artéria circundante da cidade - e ainda perpetuado numa das quintas tradicionais, Quinta da Mãe dos Homens - onde viveram e os seus herdeiros mantêm, agora na sua vertente turística de alojamento, a par de atividade agrícola.

OS VISCONDES DE CACONGO

Primeiramente temos de referir que foram dois, os designados como Viscondes de Cacongo (O 1º Visconde de Cacongo foi João José Rodrigues Leitão e o 2º Visconde de Cacongo foi Carlos Ernesto Rodrigues Leitão) embora o que mais se distinguiu e o que obteve tal titulo, pela sua acão meritória em África (Cabinda) foi o 1º Visconde, além de todas obras e iniciativas que o distinguiram no seu tempo na vida da Madeira, pelo que as referências comuns ao Visconde Cacongo, no singular, reportam-se a este.

Cronologia da vida do Visconde de Cacongo

Vamos assim referir e identificar o percurso de vida dos Viscondes de Cacongo, tentando dar conta da sua genealogia e vida na Madeira, tendo presente  a situação frequente e comum da existência de homónimos, que por si provoca confusões e não raro dificulta a perceção de "quem é quem", todavia, pelos dados consultados e disponíveis conseguimos distingui-los - sem prejuízo de eventuais erros ou omissões que a seu tempo e se detetarmos, haveremos de corrigir e atualizar - mas que permitem diferenciar o percurso de vida de cada qual, não obstante termos constatado contradições e confusão de personagens em alguns dos documentos existentes e informações publicadas sobre os mesmos.

Assim, do que apurámos, podemos referir o seguinte:

-  Na genealogia familiar desta família, circunscrevendo ao limite temporal da vida dos mesmos no que importa para a identificação dos Viscondes de Cacongo, verifica-se que existem três pessoas com o mesmo nome ( João José Rodrigues Leitão)  ou seja, homónimos, conforme se identifica:

1. João José Rodrigues Leitão, comerciante e banqueiro, nascido em Ponte de Barca (1816 /1893?) e que veio para a Madeira (Funchal)  com o seu sobrinho homónimo, aqui fez a sua vida de comerciante abastado, até ao fim dos seus dias;

Adquiriu a Quinta de Nossa Senhora Mãe dos Homens (ainda hoje existente, inserida em projeto turístico)  conhecida por Quinta do Visconde, e era sócio da casa bancária "Rodrigues Leitão &Filhos", fundada em 1870 e que posteriormente, entrou em falência.

2. João  José Rodrigues Leitão, nascido em Ponte da Barca ( 1843-1925) sobrinho que acompanhou o tio na sua vinda para a Madeira, e que era filho do irmão deste  (Manuel António Rodrigues Leitão  e de D. Maria Joaquina de Oliveira), comerciante e que do Funchal partiu para África, onde prosperou e se evidenciou no problema da anexação do enclave de Cabinda(Cacongo), sendo por isso agraciado pelo Rei D. Carlos I , concedendo-lhe o título de "Visconde de Cacongo";

3. João José Rodrigues Leitão Júnior (1875-1898), filho de João José Rodrigues Leitão, comerciante e banqueiro, tio do 1º Visconde de Cacongo, tendo este ido também para África exercer a sua atividade comercial, onde faleceu muito jovem (aos 23 anos) em Lândana (Cabinda/Angola);

4. Carlos Ernesto Rodrigues Leitão (1878/1958), filho do irmão de João José Rodrigues Leitão (banqueiro) - Pedro Petropolitano Rodrigues Leitão - , sobrinho do 1º Visconde de Cacongo e que por ser o seu único herdeiro, ao tempo, teve direito ao título de 2º Visconde de Cacongo, título confirmado pelo Rei D.Manuel II, já na situação deste em exílio em Londres, ou seja, quando já não existia a monarquia em Portugal.

D.Manuel II foi o último rei de Portugal(reinou de 1908 a 1910), tendo ascendido ao trono após a morte de seu pai (D.Carlos) e de seu irmão mais velho (D. Luis Filipe, príncipe real).                           

 Este Visconde, teve um percurso de vida diferente do seu antecessor, mais dedicado ao gozo da vida,  faleceu em 1958, sem herdeiros legítimos (descendentes/filhos) , sendo herdeira legitimatária, sua sobrinha, D. Cecília Leitão Branco e Brito ,casada com Ricardo Nascimento Jardim, proprietária actual da Quinta da Mãe dos Homens.

A Vida e obra do Visconde de Cacongo

Como  já dito, quando é referenciado o " Visconde de Cacongo", estamos perante, o 1º Visconde, ou seja, João José Rodrigues Leitão (filho do irmão do seu homónimo banqueiro), já que o 2º Visconde ( Carlos Ernesto Rodrigues Leitão), não deixou lastro significativo e positivo, pois  não terá tido uma vida exemplar, nem de destaque).

A vida deste nobre, é marcada pela ação empreendedora, quer na Madeira, quer em África, onde está ligado à posse/protetorado de Portugal do enclave de Cabinda (Cacongo), quando a França pretendia a sua anexação, desta iniciativa, resultou a concessão do titulo  de Visconde de Cacongo  pelo Rei D. Luis I, por decreto e carta real de 1 de agosto de 1884, pelos seus serviços prestados à Coroa.

Pelo Tratado de Chinfuma (19 de abril de 1883), é reconhecida a soberania de Portugal pelos povos indígenas dos vários reinos, sobre os territórios de Cabinda/Angola, sendo outorgantes deste documento, para além de representantes das autoridades locais e dos povos, comerciantes, entre os quais o Visconde de Cacongo, João José Rodrigues Leitão.

Quando regressou à Madeira, o seu tio banqueiro, estava em situação económica difícil, tendo aquele adquirido a Quinta da Mãe dos Homens, que estava na iminência de ser perdida por questões financeiras, quinta onde viveu, mantendo-a na família e demais património. Casou com a filha do seu tio (sua prima). Deu continuidade à casa bancária.

Apesar do Visconde de Cacongo não ter nascido na Madeira, considerava esta a sua terra adotiva, pois achava-se ligado  por laços de parentesco (conf. Elucidário madeirense).

Protegeu as classes mais desfavorecidas, às quais  deu apoio social e económico, apoiou obras  como a fundação do Manicómio "Câmara pestana" e a construção do cais da freguesia do Faial.

Está ligado à introdução da plantação do eucalipto na Madeira, numa época em que esta madeira era utilizada na construção.

Adquiriu na Feira Internacional de Paris (França) o célebre Orquestrofone,  aparelho musical inovador - algo próximo dos realejos - que de algum modo imita a sonoridade de uma orquestra, intrumento  fabricado por Limonaire Fréres, que trouxe para a Madeira, para abrilhantar as festas nos seus jardins e que está atualmente exposto no museu da Quinta das Cruzes (Funchal).

É-lhe  atribuído o reavivar da tradição da celebração da passagem de ano, com recurso a fogo de artifício, que as famílias mais abastadas passaram a recriar, no que será o antecedente próximo do atual espetáculo pirotécnico do fogo de artifício do fim do ano na Madeira.

Faleceu, em 1925, sem herdeiros, pois os seus filhos tinham entretanto falecido, deixando um importante património, mas sobretudo uma obra de cariz social e filantrópico e o seu marco na história da colonização de África, particularmente do enclave de Cabinda, hoje, parte integrante da República popular de Angola.

Concluindo: Quando se evoca o Visconde de Cacongo, trata-se do 1º Visconde ( João José Rodrigues Leitão), um cidadão muito empenhado e comprometido com as questões sociais e filantrópicas, comerciante empreendedor e banqueiro, numa vida e atividade intensa, que o levou a África nos negócios de família, onde soube colher a atenção e respeito da população local - particularmente do Cacongo - ficando na história  da colonização africana (Cabinda/Angola) pela sua ação em defesa dos interesses da Coroa portuguesa, levando a que fosse reconhecida a posse por Portugal do enclave de Cabinda, feito que teve reconhecimento real, com a atribuição do título nobiliário de Visconde de Cacongo, titulo que honrou com a sua meritória ação social e filantrópica junto das populações mais desfavorecidas e em obras marcantes na vida regional da Madeira, ficando o seu nome ligado à história e desenvolvimento desta Região, pelo que este nosso apontamento é um singelo tributo à sua vida e obra.

* Rui Gonçalves da Silva/Funchal/2021

Busto do Visconde de Cacongo (escultor Franco Fernandes) - Quinta da Mãe dos Homens/Funchal/Madeira

Orquestrofone

/ Museu da Quinta das Cruzes/Funchal/Madeira