*O SECTOR DA OBRA DE VIME NA MADEIRA - do apogeu ao declínio

O sector da obra de Vimes da Madeira – do apogeu ao declínio: contributo para

a salvaguarda e valorização desta atividade

Enquadramento geral

No âmbito das atividades artesanais da Região Autónoma da Madeira, o sector da obra de vimes (cesteiros) sempre constituíu uma importante atividade tradicional, a par do Vinho, das Flores e dos Bordados – ligada à tradição e particularmente ao sector primário (aproveitando a cultura dos vimeiros) e ao trabalho no contexto da vida rural, dos hábeis trabalhadores, exercido em trabalho domiciliário (os seus executantes realizam a obra de vimes em anexos das suas precárias habitações, em complemento de outras tarefas ligadas à agricultura) e obtêm deste modo, complemento nos seus parcos rendimentos de subsistência, com as vantagens de exercerem, na sua maioria um trabalho algo autónomo – recebiam os trabalhos para execução de acordo com os modelos apresentados pelos intermediários, com remuneração “à peça”, com preços determinados – e assim dispunham do seu tempo de trabalho, e acordo com a sua disponibilidade, não raro, em longas horas, para obterem escassos ganhos.

A obra de vimes, cuja concretização depende essencialmente de trabalho manual, com recurso a escasso equipamento auxiliar, é assim, uma tarefa acessível de executar, desde que os seus executantes, sejam dotados de destreza e habilidade, como era o caso dos trabalhadores/artesãos das zonas rurais, dos vários concelhos da Região, com incidência particular na Camacha, centro importante e marcante desta atividade.

A obra de vimes – concretizada numa imensa variedade de modelos e de peças de mobiliário (as célebres cadeiras, mesas e outros artefactos) a obra leve (cestos, floreiras, peças decorativas) – expressa um tipo de trabalho, ao nível do que se pode identificar como artesanato:

“ O artesanato é a arte e as obras dos artesãos. Um artesão, por outro lado, é a pessoa que realiza trabalhos manuais, sem recorrer a máquinas nem a processos automatizados. Não existem, por conseguinte, duas peças de artesanato exatamente iguais.”

Deste modo, a obra de vimes, no que se refere à Madeira, assume também uma dimensão social e cultural, além de económica – integra a vivência regional, identifica a Região, representa uma fonte de rendimentos para segmentos da população, particularmente em determinados contextos rurais – não obstante o ciclo de crises, que tem diminuído o seu peso e importância.

Este apontamento, sumário e contendo os aspetos mais determinantes da vida deste sector e desta atividade, dos primórdios e dos tempos de desenvolvimento, até aos nossos dias, de crise e evidente definhamento, aborda o histórico da obra de vimes, dos seus empreendedores e dos seus obreiros (artesãos e auxiliares), evidenciando a sua tradição e a importância desta atividade para a Região, com breve incursão ao circuito produtivo e à relação laboral estabelecida, nos seus contornos específicos, às tentativas de revitalização empreendidas nos tempos mais recentes e na criação de regime tutelar, ao trabalho produzido em sede do grupo de trabalho constituído para avaliação e medidas inerentes (1996), com o enquadramento jurídico elaborado (Regulamento da atividade artesanal da obra de vimes na Região Autónoma da Madeira/2003), tudo o que foi ou não feito, para que este sector tivesse a dimensão, o apoio, o estatuto que lhe era devido, de modo a garantir e assegurar a sua sustentabilidade e consequentemente o seu futuro, quer das empresas existente (e que entretanto, na sua maioria, cessaram a atividade) quer dos seus trabalhadores e artesãos.

Nota pessoal: o presente trabalho embora circunscrito a breve anotação, pretende ser uma alerta e um testemunho, no sentido da valorização desta importante atividade, em memória de um passado de empenho e trabalho de tantos e resulta do acompanhamento desta problemática, em tempos passados, no exercício da nossa função diretiva na área do Trabalho e da coordenação e liderança do grupo de trabalho então constituído (1996/1997) para avaliação do sector da obra de vimes, grupo constituído por vários especialistas, técnicos e elementos ligados à atividade, que culminou na formulação de propostas – reportadas a todas as fases do processo da obra de vimes, ou seja, da cultura, fabrico, venda e exportação – medidas e sugestões que a serem assumidas, adotadas e concretizadas a seu tempo, seriam essenciais para a desejada revitalização do sector, preparando-o, como se antevia, para os desafios da modernidade, da competitividade e da crise que o afetou, de forma tão marcante.

Ao tempo existiam ideias e projetos criativos – p. e. a criação/instalação de Centro da obra de Vimes – que congregaria todas as fases do processo produtivo e seria um serviço comum e de apoio a todos os intervenientes nesta atividade, criado à escala e dimensão, com instalações próprias (terrenos na Camacha) com cultura de vimeiros, preparação do vime, cozedura, fabrico e venda , além de constituir núcleo museológico do ciclo do vime e da obra executada, assegurando a redução de custos, na partilha de meios, tecnologia e procedimentos, com recurso a design e marca – porém este projeto, arrojado, pioneiro e inovador, não foi objeto de concretização, pois a sê-lo poderia ser o suporte da manutenção e subsistência desta atividade, como valor, referência e património cultural da Região (esta matéria consta, entre outras, nas medidas sugeridas nas conclusões do grupo de trabalho tripartido).

Origem do Artesanato de Vimes

Tudo indica que o surgimento da obra-de-vimes iniciou-se na Camacha, de acordo com o engenheiro Vitorino José dos Santos, que publicou no nº4 do boletim do trabalho industrial, em 1907, uma monografia sobre este trabalho, explicando a provável origem e desenvolvimento primitivo desta atividade na freguesia da Camacha, conforme se transcreve:

“A indústria dos móveis de vimes teve o seu aparecimento há aproximadamente 60 anos, e começou pelo trabalho em cadeiras, copiados do fabrico de outras cadeiras construídas então na Madeira com palha de centeio, por presos da cadeia do funchal. Supõe-se ter sido algum preso da freguesia da Camacha quem levou, ao sair para a freguesia, os conhecimentos que havia adquirido na aprendizagem feita na cadeia, e assim se foi lenta e progressivamente desenvolvendo a indústria naquele meio, que foi durante muitos anos o único ponto em que ela se exerceu. Um súbdito inglês, de nome William Hinton, importante industrial há poucos anos falecido na Madeira, em avançada idade, parece ter também influído nas tentativas iniciais desta industria auxiliando os primeiros obreiros com os conhecimentos que tinha da indústria destes móveis, já fabricados na Inglaterra e Alemanha com hastes de cipó, por cuja flexibilidade e outras propriedades se assemelham muito aos vimes madeirenses”.

Ainda, outros estudiosos que concordam com este facto, afirmam:

“ Foi Antonio Caldeira o introdutor do trabalho de vimes, o qual desmanchando uma esteira que tinha vindo do estrangeiro, por intermédio de um membro da família Hinton, estudou a forma e fabrico dela, tomando como ponto de partida para atingir o seu ideal, a flexibilidade do vime”.

A cultura/plantação dos vimes

A cultura do vimeiro foi introduzida na Região pelos primeiros colonos, tendo-se adaptado bem às condições do clima e do solo, em plantações em terrenos marginais às outras culturas, perto de cursos de água ou de zonas de fácil irrigação, não exigindo grande manutenção.

O vimeiro, arbusto cujas ramificações (hastes) constituem os vimes, matéria-prima para a obra dos artefactos de vime, que na Madeira é da variedade “salix fragilis”,sendo uma espécie que produz hastes fortes e resistentes.

O vimeiro reproduz-se com facilidade, sendo plantado por estaca, começando a produzir dois anos após a plantação, adquirindo a plena produção ao 4º ano, tendo a duração média, na ordem dos doze anos.

A poda do vimeiro é feita anualmente no período de descanso vegetativo (entre janeiro a março).

A produção anual de vime verde, na Madeira, nos tempos normais, situava-se em cerca de 6 mil toneladas (1977), tendo por vários fatores diminuído, pelo abandono da sua cultura, face aos custos e poucos proventos, descido pra as 3 mil toneladas, sendo o seu cultivo na sua maioria, em 9 freguesias (Boaventura, Santana, Faial, S. Roque do Faial, Camacha, Machico, Curral das Freiras, Santo da Serra, Porto da Cruz, S. Jorge, Ilha de S. Jorge, Arco de S. Jorge e São Vicente).

Esta cultura ocupa cerca de 200 hectares e envolve cerca de 2 mil famílias.

As áreas de produção do vimeiro tem oscilado, com tendência para a sua diminuição:

217,8 ha (1976); 242,6 ha (1983); 184,7 ha (1993).

Produção de vime verde na Madeira

freguesia Toneladas %

Boaventura 580 19,4%

Santana 460 15,3%

Faial 390 13,0%

São Roque do Faial 340 11,3%

Camacha 250 8,3%

Machico 250 8,3%

Curral das Freiras 225 7,5%

Porto da Cruz 140 4,7%

Santo da Serra 135 4,5%

Outras freguesias 230 7,7%

Fases da produção do vime

O processo de produção do vime envolve as seguintes etapas:

Plantação/cultivo - Colheita/poda – calibragem – cozedura – descasque – secagem – armazenagem – fabrico da obra

Poda do Vime

Quando os vimeiros estão em plena produção, com os rebentos aptos à colheita, a poda destes ocorre entre Janeiro e março, ocupando nesta tarefa, em média, cerca de 200 trabalhadores durante cerca de 50 dias, que para além do corte das hastes, procedem à limpeza do vime (cortes dos galhos laterais), à junção/amarração do vime e transporte para os locais de preparação posterior.

Calibragem do Vime

Após a poda e arrumação do vime cortado em “molhos,” é realizada a sua calibragem (medição do seu diâmetro) que consiste na separação dos vimes por tamanhos e espessura, dando origem a lotes diferenciados.

Cozedura

A cozedura implica a introdução do vime verde (vime bruto) num caldeiro/tanque com água, submetendo cada porção/lote, em fervura durante cerca de 3 horas.

Descasque

O vime é malhado e descascado manualmente, existindo processos em que envolve ainda permanecer mergulhado na água (descasque a frio) durante algum tempo.

Existe também o descasque mecânico.

Secagem

Após o descasque o vime é amarrado em porções e colocado a secar ao Sol no tempo necessário e uma vez seco é colocado em lotes calibrados de cerca de 50 Kg e posteriormente colocados em armazenamento, prontos a serem trabalhados na obra de vime.

São necessários cerca de 3 Kg de vime verde para se obter 1 Kg de vime seco.

Medidas de calibragem do vime: Vime grosso (15 a 25 mm); vime médio (10 a 15 mm);vime fino (8 a 10 mm); vime extra-fino (6 a 8 mm):

Designação do Vime: espessura/cumprimento:

Liaça grossa, liaça média, liaça fina, champagne, champagne miúdo, xadrez, vime fino.

Comercialização do vime

A produção do vime, processa-se da seguinte forma e com a intervenção dos seguintes agentes:

O agricultor planta o vime ou procede à sua manutenção (poda e recolha), após o que procede à venda de lotes de vime verde (bruto) a terceiros. Estes por seu turno, procedem à sua calibragem, cozedura, descasque, secagem e armazenagem, vendendo o lote seco a intermediário, que separa os lotes por tamanhos e procede à venda destes, aos fabricantes e artesãos, que adquirem esta matéria prima para execução das encomendas de obra de vime.

Preparação do Vime para fabricação de obra

A preparação do vime para a fabricação de obra (peças) implica as seguintes fases: seleção, calibragem, humidificação (o vime para ser trabalhado pelos artesãos necessita de ficar previamente na água, para ficarem húmidos e maleáveis), limpeza (corte de nós e imperfeições),transformação em liaça e miolo e corte de hásteas (com recurso a máquina de rachar e máquina de tirar liaça).

Fabricação de obra (cestaria e outra)

Finda a preparação do vime, como matéria-prima para a obra a executar pelos artesãos/trabalhadores, estes procedem à manufaturação de toda uma imensa variedade de produtos com engenho, habilidade e arte, de acordo com modelos usuais/tradicionais e solicitações dos clientes/importadores, sejam mobílias, cadeiras, mesas, toda a variedade de cestos, objetos decorativos, num imenso acervo que urge mostrar, identificar e preservar, como património sócio-cultural da Região, dos seus artesãos e marca identitária da Madeira no Mundo.

Comercialização de obras de vime (1998-2004)

Anos Valor/euros

1998………………………………… 278.921

1999 ……………………………… 218.494

2000 ………………………………. 192.250

2001 …………………………….. 121.731

2002 …………………………….. 114.361

2003 …………………………….. 24.743

2004 ……………………………. 37.099

Fonte: IVBAM - Instituto do Vinho, do Bordado e do Artesanato da Madeira, I.P.

Obra do vime - relações laborais/artesanato

Um sector importante no domínio do trabalho no domicílio na Região Autónoma da Madeira é a atividade da Obra de Vime (verga), cujos produtos e artefactos constituem uma referência regional.

Sem atingir a dimensão do bordado, a atividade da obra de vime, assume também características próprias no seu processo produtivo, desde a cultura, poda e preparação do vime, passando pela confeção da obra, com execução em pequenas unidades familiares ou no domicílio dos obreiros, até à venda e exportação destes.

Esta atividade também é atingida pelas crises de mercado e de competição, afetando-a significativamente, do que resulta um acentuado decréscimo de trabalho.

Principais medidas legislativas do sector dos Vimes

A inventariação das medidas legislativas e outras adotadas em relação ao sector dos Vimes, demonstra a situação desta atividade, particularmente no que aqui importa realçar, ou seja, no enquadramento laboral dos seus profissionais:

1.Decreto Regional nº 26/79/M: enquadra o regime de Segurança social da atividade.

2. Portaria nº 1099/80: regime do artesanato

3. Decreto Legislativo regional nº 6/83/M: regime dos trabalhadores independentes

4. Despacho do Secretário Regional dos Assuntos Sociais de 1988: Segurança Social dos profissionais da obra de vime por conta própria.

5. Decreto- Lei n º440/91: regime jurídico do Trabalho no Domicílio

6. Decreto Legislativo Regional nº 11/92/M: aplicação à Região do DL nº 440/91 (Regime Jurídico do Trabalho no Domicílio)

7. Resolução nº 274/96: Constituição de grupo de Trabalho tripartido para avaliação da situação no sector dos Vimes, com incidência nas questões sócio-laborais e no e no enquadramento jurídico das relações de trabalho, emprego e segurança social.

8. Portaria nº 93/96 de Julho: Constituição e composição do grupo de trabalho tripartido para avaliação do sector de Vimes.

9. Portaria nº 190/96 Novembro: reformulação da composição do grupo de Trabalho.

10. Grupo de Trabalho – concluiu e apresentou Relatório a 26/Maio/1977

Realizou levantamento global do sector desde o cultivo do Vime, à sua preparação, Produção e circuito da obra de vime, sistemas de trabalho, estatuto laboral, regime De Segurança Social, até à comercialização e exportação do produto.

11. Decreto Legislativo Regional nº 16/2003/M: regula atividade da Obra de Vime - Este diploma rege a atividade artesanal da obra de vimes da Região, abrangendo todos os agentes económicos deste sector de atividade reconhecidos como “ Artesãos, aprendizes e unidades artesanais “.

É artesão da obra de Vimes, no conceito deste diploma:

“ O trabalhador que exerce a atividade dominando um conjunto de saberes e técnicas a ela inerentes, ao qual se exige um apurado sentido estético e perícia manual”

Quanto ao estatuto de trabalho estabelece o diploma o seguinte:

“ Os artesão da obra de vimes podem exercer individualmente a atividade, adquirindo ou recebendo a matéria-prima e vendendo o produto final que executam onde, quando e como quiserem no respeito pela encomenda recebida de harmonia com modelo salvaguardando a fidelidade aos processos tradicionais, sem prejuízo da compatibilização com a inovação, venda que pode ser feita a comerciantes da obra de vimes ou ao público em geral.”

“ Os artesãos da obra de vimes podem também exercer a atividade vinculados por contrato de trabalho à respetiva entidade empregadora “

Quanto ao sistema remuneratório (cf. Artº21º) é estabelecido que este será fixado anualmente nos seguintes termos:

“ O pagamento da obra de vimes deve ser efetuado ao artesão no momento da sua entrega. O valor mínimo relativo às peças em vime é fixado por uma comissão de valor e qualidade, composta por representantes dos empresários do sector, dos artesãos e do IBTAM, que a ela preside, tendo em conta o tempo médio de execução da peça da obra de vimes e os valores remuneratórios para a execução do mesmo tipo de trabalho”.

Quanto à proteção social do artesão o diploma estatui (artº 23º):

“ Os artesãos da obra de Vimes e aprendizes, bem como as unidades produtivas artesanais na qualidade de entidades empregadoras e dadoras de trabalho, são obrigatoriamente abrangidos como beneficiários e contribuintes pelo sistema de solidariedade e de segurança social.

Aos artesão da obra de vimes são garantidas todas as prestações correspondentes às eventualidades cobertas pelo regime geral de segurança social, com exceção das prestações de desemprego para os artesãos por conta própria”

Em relação ao comércio externo, observa-se a base da exportação regional que se concentra no sector ligado a exportação turística, com as respetivas receitas a ultrapassar as exportações de bens provenientes do sector primário e das indústrias transformadoras. No que se refere às exportações destes últimos sectores, estas encontram-se concentradas num grupo de 5 produtos principais:

• Banana• Bordados• Vinho da Madeira• Obras de Vime• Flores

O artesanato do Vime é uma atividade tradicional da Região Autónoma da Madeira, integrando os sectores económicos tradicionais e da cultura regional. Entre a produção e a confeção da obra de vime, esta atividade envolve centenas de postos de trabalho, com evidente expressão económica em algumas localidades da Região, e dos quais dependem muitas famílias. Devido à concorrência de produtos provenientes de países terceiros, nomeadamente da Ásia, este sector sofre uma crise profunda que, a não ter alterações e medidas de fundo, corre o risco de desaparecer ou de se tornar uma atividade muito residual. Urge a adoção de medidas em defesa desta atividade peculiar desta Região, pois as ações até agora desencadeadas não têm revelado eficácia e resultados para dinamizar e revitalizar este sector, tanto ao nível da produção do vime, como da sua confeção artesanal e sua comercialização. São necessários programas específicos de apoio, com maior amplitude, que incentivem e estimulem a modernização das técnicas de cultura e tratamento do vime, assim como do estudo na área da renovação e atualização de produtos a executar, assim como das medidas conducentes à sua promoção na procura de novos mercados.

De acordo com os programas comunitários existentes, de apoio ao artesanato regional, urge recorrer e beneficiar destes, para que permitam a subsistência e modernização, enquanto produto artesanal a preservar, pela sua qualidade, história e tradição.

A obra de vime é um sector que vem sofrendo as consequências da crise, por vários fatores, nomeadamente por não se ter adaptado e reestruturado a tempo, face aos desafios da modernidade e da concorrência, com encerramento de empresas exportadoras e abandono de artesãos/trabalhadores, perante os baixos rendimentos, para além do facto da própria matéria-prima (vimes) escassear, pelo abandono do seu cultivo, num ciclo de degradação que se impõe, se não inverter, pelo menos atenuar, com medidas e incentivos adequados.

Relações de trabalho: trabalho dos artesãos

Esta atividade desenvolveu-se, ao longo dos tempos, na base de relações de trabalho, específicas e de certo modo atípicas, seja na fase inerente ao cultivo e fases de preparação do vime (trabalhadores agrícolas pagos à jornada), como era tradicional no trabalho nos campos, seja na execução e fabrico da obra de vimes (artesãos e trabalhadores subordinados) pagos à peça.

Na execução da obra de vimes, o trabalho é realizado essencialmente no domicílio dos artesãos, remunerados à peça, na qualidade de artesãos/trabalhadores independentes, embora alguns destes, com trabalhadores que auxiliam nas tarefas, como trabalhadores subordinados

Estas situações de trabalho, decorrem em freguesias no mundo rural, o que permite estas especificidades e de algum modo o aproveitamento deste trabalho, mal remunerado e num estatuto algo indefinido, situação que posteriormente (pós 25 de abril e da autonomia regional) foi objeto de avaliação e enquadramento jurídico, com intervenção sindical e das instâncias laborais regionais, no sentido da sua proteção.

Os artesãos dispunham de regime de segurança social (conforme Decreto legislativo regional nº26/79/M) e posteriormente de regime próprio (Decreto Legislativo Regional nº 16/2003/M).

O conceito legal de artesão (Portaria nº1099/80 de 29 de dezembro), considera como tal “o trabalhador que, isoladamente, em unidades de tipo familiar ou associado, transforma matérias-primas e produz ou repara objetos, ao qual se exige um certo sentido estético e habilidade ou perícia manual, podendo no entanto, usar máquinas, como auxiliares do trabalho, e cuja intervenção pessoal, dominando todas as fases do processo produtivo, constitui fator predominante no mesmo, ao contrário do que se passa na atividade industrial ou de produção em série”.

No caso concreto do artesão da obra de vimes, para este assumir o controlo de todo o processo deveria determinar o preço do seu trabalho, o que não acontecerá na maioria das situações.

Segundo dados disponíveis, no que se refere ao número de trabalhadores normalmente envolvidos no conjunto deste sector (em média, eram cerca de 2.000 e já terão sido cerca de 4.000) na sua maioria a tempo parcial (1.200), repartidos pelas tarefas da poda (200),calibragem (75), descasque (275) e fabrico (1.500).

Alguns dados históricos do setor

Esquematizam-se alguns dos principais dados da história deste sector:

- 1425: introdução da cultura do vimeiro pelos primeiros colonos quando se iniciou o povoamento;

- 1590: referência a obras de vime usadas no transporte de pedras para a construção de levadas;

- 1812: existem referências históricas da produção de cadeiras de vime pelos presos da cadeia do Funchal;

- 1850: inicia-se na Camacha a produção de obra de vime; Primeira exposição da obra de vime (promovida na gestão do Governador civil do Funchal, José Silvestre Ribeiro)

- 1948: Constituição do Grémio dos industriais da obra de Vimes;

- 1962: Constituição da Cooperativa FoVime, por 30 fabricantes (cessou atividade em 1969);

- 1975: Constituição do Sindicato dos trabalhadores da obra de vimes e profissões afins

- 1978: criação do IBTAM

-1979: Criação da cooperativa VIMESCOP

-1988:Constituição da Associação de fabricantes de obra de vime AFVIMES;

- 1994: Constituição da sociedade por quotas – Centro de Vimes da Camacha, Lda.;

-1996 – Sindicato dos bordados e tapeçarias e artesanato (passa a integrar no seu âmbito o setor de vimes);

-1990: inicio de crise no setor, pelo declínio das exportações, pela concorrência internacional e disputa de mercados particularmente pela China;

- 1995: Falta de matéria-prima (vime seco) dando origem à importação deste do Chile, implicando a subida de preços na produção e retoma do cultivo dos vimeiros;

- 1996: Constituição de grupo de trabalho tripartido

- 2003: Decreto Legislativo Regional nº 16/2003/M: regula atividade da Obra de Vime - Este diploma rege a atividade artesanal da obra de vimes da Região, abrangendo todos os agentes económicos deste sector de atividade reconhecidos como “ Artesãos, aprendizes e unidades artesanais “.

Centro de Vimes na Camacha

O projeto do Centro de Vimes na Camacha – de iniciativa privada –e que não resultou,tinha como grandes objetivos, segundo os seus mentores:

- Manter um preço mínimo por lote de vime aos produtores, de modo a que estes não abandonassem a cultura do vimeiro;

- Diminuir o número de intermediários;

- Permitir a mecanização de algumas fases do processo produtivo nomeadamente na preparação da matéria-prima por forma aumentar a competitividade do sector, compensando assim os elevados custos da mão- de- obra;

- Proceder a uma rigorosa seleção de modelos;

- Criar novos modelos com base em estudos de mercado e no conceito de design;

- Promover o lançamento de novos modelos/ novas aplicações;

- Fomentar campanhas promocionais;

- Elaborar estudos de mercado;

- Exportar cestaria

- Garantir a cultura/plantação própria e adequada de vimeiros, bem como experimentar novas variedades, por forma a assegurar o abastecimento do mercado, garantindo assim a matéria-prima;

- Estabilizar o sector de modo a evitar as alterações cíclicas do passado, no que concerne ao preço da matéria-prima e à sua falta;

- Criar confiança entre os agentes económicos na expectativa que existam mercados para a obra dos vimes, desde exista a preocupação de ir ao encontro das necessidades daqueles e deste modo criar produtos que os satisfaçam;

- Formar cada vez mais artesãos, de modo a produzirem produtos de qualidade, dignificando a arte de trabalhar o vime;

- Cativar e incentivar os jovens para o artesanato, por forma a combater o desemprego e simultaneamente dar continuidade ao artesanato, como fonte de rendimento;

- Ajudar os artesãos na procura de apoios financeiros que possam contribuir para melhorar as condições de trabalho, dignificando assim a profissão de artesão;

- Contribuir para a recuperação desta indústria em crise, que afeta grande número de trabalhadores e famílias, bem como a economia de uma região – Camacha.

Este Centro, seria instalado num pavilhão devidamente adaptado (instalações elétricas, águas, esgotos e divisões internas), cedido pelo Governo Regional da Região Autónoma da Madeira, na Zona Industrial da Camacha, com todas as áreas de laboração e funcionamento bem definidas.

Um grande contributo que o Centro de Vimes poderia trazer, nessa nova unidade industrial, seria a mecanização possível do processo, com vista a obter redução significativa nos custos da matéria-prima. Assim, previa-se a utilização de maquinaria nas seguintes fases do processo de fabrico: poda, pesagem, carga/ descarga, descasque, liaça/ miolo e madeiras.

Este projeto, comportaria o seguinte material/equipamento:

- Transporte, carga e descarga;

- Carpintaria de apoio;

- Poda do vimeiro;

- Pintura e envernizamento;

- Instalação da rede de ar comprimido;

- Oficina de apoio mecânico;

- Máquinas de tirar/ rachar liaça, serrar e atar vimes;

- Máquinas de descascar;

- Material para cozedura e secagem;

- Material informático.

Este projeto não teve a aderência devida dos principais interessados, gerando alguma desconfiança, na medida em que:

- Tratar-se de empresa privada apoiada por fundos comunitários;

- A maioria dos artesãos não considerou o projeto viável;

- Não existiu a devida orientação e apoio público ao projeto;

- Faltou o enquadramento do projeto, na situação económico-social complexa da indústria dos vimes.

Ação do grupo de trabalho tripartido

Por decisão contida na Resolução nº 274/96 de 7 de março do Governo regional foi constituído grupo de trabalho tripartido” para análise, estudo, inventariação e propostas tidas por apropriadas, sobre a situação no sector dos vimes, com incidência na sua vertente social, nas relações profissionais subjacentes, na aferição do estatuto económico dos seus agentes, nos vínculos laborais e na avaliação, o mais ampla possível, das pessoas envolvidas nesta atividade profissional e com particular peso na tradição da nossa Região”.

O trabalho empreendido por este grupo, foi inovador e pioneiro, abordando em toda a sua dimensão a problemática do sector do Vime, quer no plano das estruturas e metodologias de trabalho, quer nos meios e recursos humanos necessários à revitalização desta atividade, culminando na elaboração e apresentação de relatório, com sugestões e propostas na perspetiva da viabilização futura, porém não foram devidamente acolhidas, nem concretizadas, pois de outro modo, poderíamos ter um setor estável e mais preparado para os constrangimentos das crises e problemas de mercado.

Recordemos o essencial deste trabalho, para que de algum modo as sugestões formuladas, possam ainda ser reajustadas e adaptadas aos nossos tempos e contribuam, a par de outras iniciativas, para a revitalização deste setor.

Considerações gerais

O diagnóstico do sector consta de vários contributos sobre esta temática, que integram este Relatório.

O vime é, de facto uma cultura com longa tradição na Região, constituindo património que urge defender e tudo fazer para torná-lo mais dinâmico, criando todas as condições para o seu presente e sobretudo garantindo o seu futuro.

O número de pessoas/famílias envolvidas nesta atividade, a sua importância sócio económica, exige de todos, o repensar da atividade e a procura de soluções que preservem este sector, melhore a sua rentabilidade e proporcione os adequados e justos rendimentos a todos quantos dependem deste.

Neste sentido a concretização das medidas propostas, particularmente constante dos pareceres dos representantes das várias áreas - Agricultura, IBTAM, Formação Profissional, Emprego, Trabalho, Associações Sindicais e patronais - são certamente excelentes contributos para a mudança.

No domínio das relações laborais e face à complexidade de situações criadas, constitui uma das áreas, com maior acuidade, todavia, a obra de vimes em todas as fases do seu processo, depende muito da qualidade e motivação da mão-de-obra envolvida e sem esta, nada se poderá fazer. Daí o conjunto de propostas, que na sua articulação e adequação, tendo em linha de conta o sector e a necessidade de acompanhar a evolução e a realidade laboral, poderão gerar opções de soluções, discutíveis e controversas

Se sem vime não se faz obra, sem mão-de-obra estas não se executam, sem vendas e compradores não se gera a necessária procura para o escoamento, ou seja, tudo se interliga, nada se exclui, mas este ciclo não é necessariamente fechado e condenado aos atuais padrões, problemas e condicionantes: pode ser ativado e melhorado ganhando outra dimensão, prosperidade e dinâmica.

É este desafio que tentámos superar. Com o conjunto de sugestões e propostas, com os textos elaborados, com a multiplicidade de perspetivas, de sentidos opostos e também de posições equidistantes, este Relatório faculta todo um manancial de informação para servir de suporte a opções, avaliações mais congregadoras, noutra escala de abordagem, num contexto de trabalho mais restrito e mais operativo.

Síntese conclusiva

1. O Relatório constitui um conjunto diverso de contributos, que são partes integrantes do todo e consequentemente refletem o desenrolar dos trabalhos, as posições assumidas por cada e todos os membros do grupo, as sugestões e propostas apresentadas, cuja leitura constitui elemento fundamental para o entendimento desta problemática.

2. Pela dificuldade das questões que se foram colocando, pela variedade das posições assumidas, torna-se difícil apresentar sínteses que expressem a globalidade e traduzam cabalmente o teor de cada posição, por isso, as súmulas que se apresentam, incluindo as que pretendem sintetizar posições conclusivas, tentam esquematizar ideias base, como parte de um todo, para mais facilmente permitir uma visão do essencial - no que isso possa conter de subjetivo e de imprecisão - para possibilitar, um evidenciar das questões chave e do mais determinante de cada posição.

3. O elenco de conclusões - algumas das quais inequívocas e objetivas e de implantação mais fácil - bem como das propostas, podem constituir, em algumas matérias, contributos exequíveis no imediato, através do recurso aos meios/departamentos que possam concretizar tais sugestões.

Quisemos no grupo - porque orientámo-nos por uma perspetiva global, moderada e objetivamente realista - abordar todo o sector, para com a concretização conjunta e em várias fases do processo das medidas propostas (sejam apoios financeiros, sejam medidas técnicas ou alterações pontuais), pudesse o sector, com redução de custos, ganhos de produtividade e competitividade, permitir acolher, outras medidas, nomeadamente na vertente laboral, com alguns custos, evidentes, sem perigar a capacidade financeira do sector e sem afetar o escoamento da obra, a preços, qualidade e prestigio, concorrenciais.

Entre duas opções possíveis: a de constatar a inviabilidade de qualquer mudança, seja de que dimensão for e a procura de caminhos de melhoria, a nossa opção – e da maioria do grupo - foi por esta via: criar condições para mudar e melhorar o sector em vários domínios, beneficiando todos, sem aventureirismos irrealistas, mas com equilíbrio e sensatez.

1.Na produção do vime

a) Apoio ao cultivo do vime, com recurso a novas espécies (reconversão)

Nesse sentido, eis o essencial das propostas/sugestões:

Medidas: * Apoio técnico da Agricultura na experimentação de espécies adequadas à obra de vime;

*Subsidiação à plantação por m2.

* Divulgação de programas comunitários de apoio financeiro, ao cultivo e à poda e outras operações.

b) Aumento de produtividade das plantações, pelo recurso a:

- Renovação das espécies

- Cultivo do vime em zonas apropriadas

- Incremento de mecanização

- Incentivo aos trabalhos complementares (cozedura e descasque)

- Garantia de preço mínimo - apoio ao associativismo

Medidas: * Ações de informação pelos técnicos agrícolas e das áreas dos programas e apoios comunitários.

*Incentivos, através de programas próprios à modernização e aquisição de novos meios de trabalho. (p.e. poda mecânica; cozedura e descasque em zonas comuns).

c) Apoio na preparação dos terrenos, zonas de drenagem; Ajuda financeira à plantação por m2 de vimeiro.

d) Sessões de esclarecimento dirigidas e coordenadas por técnicos das várias áreas - para divulgação de todos os programas comunitários existentes.

e) Apoio do IBTAM na formulação de candidaturas elegíveis.

f) Fomento do Associativismo, para maior facilidade de recurso a programas e apoios.

g) Incentivos à mecanização do sector.

2. Operações Complementares

a) Estímulo à criação de centros que realizem estas operações, com condições de qualidade, meios e preços competitivos.

b) Melhoria das condições de prestação destes trabalhos no domínio da Higiene e Segurança.

c) Níveis de Remunerações adequados.

3. Fabrico de obra de vimes

a) Aumento da competitividade, pelo recurso a melhores condições de execução do trabalho, novas técnicas, novos equipamentos, opções ergonómicas, melhoria geral dos locais de trabalho, seja em Higiene, seja em Segurança.

b) Criação de condições compensatórias e atrativas para a mão-de-obra, através de adequada remuneração, horário de trabalho, descansos e férias, segurança social e demais apoios.

Medidas: *Legislação laboral apropriada e Segurança Social adaptada (conforme propostas em anexo).

c) Recurso à mecanização em algumas fases do fabrico.

Medidas: o processo de tratamento, poda, transporte, calibragem, cozedura, descasque, secagem e armazenagem, deve ser melhorado e racionalizado, com recurso a novas técnicas (mecanização), conjugação de recursos e meios (pelo Associativismo), apoios financeiros, em ordem à redução de custos, melhoria da qualidade e níveis de rendimento.

d) Instalação de Centros de Vimes, em moldes abertos, ao associativismo de todos, de forma à racionalização do circuito de produção, visando o aproveitamento de espaços e meios, na perspetiva de ganhos de competitividade, qualidade e preços.

Medidas: Apoios ao Associativismo recurso aos programas comunitários de apoio linhas de crédito para concretizar o funcionamento de tais centros operacionais.

*Condições para a pronta instalação do atual Centro de Vimes, com ampla abertura a novos associados, com cedência de espaço e área adequada de instalação.

e) Criação da Zona de Fabrico do Artesanato do Vime da Madeira, onde em área própria pudessem ser instaladas várias unidades, individuais ou coletivas, congregando num mesmo espaço as várias fases do processo, com zonas e serviços comuns, desde a preparação, armazenagem, fabrico, expediente, exposição, venda e exportação.

Medidas: Cedência de áreas infraestruturadas tipo Zonas Industriais, mediante o pagamento de rendas acessíveis e apoios de instalação.

f) Criação de condições para a consagração de parâmetros de preços mínimos/indicativos à obra, em função do tempo de execução, vime e matéria-prima incorporada, grau de dificuldade e técnica qualidade.

g) Regime laboral apropriado. (conforme os textos propostos)

4. Comercialização

a) Apoio a todas a unidades com interesse na exportação, nacional e internacional.

b) Criação de Marca Regional.

c) Fomento de novos designs.

d) Promoção do Artesanato do Vime.

e) Fretes reduzidos.

f) Acompanhamento e Apoio do IBTAM em todas as fases.

g) Registo de patentes.

h) Registo de empresas e artesãos do vime.

5. Outras propostas gerais:

b) Introdução nos currículos escolares, no domínio oficinal, da aprendizagem da obra de vime.

c) Estimulo às visitas de estudo aos Centros produtores, pelas Escolas.

d) Apoio e fomento de novos designers da obra de vime, criando prémio anual de estímulo à criatividade e inovação (a promover pelo IBTAM)

e) Apoio à criação de empresas com majoração nos sectores tradicionais (negociando linhas de crédito bonificado).

g) Incentivo da utilização de obra de vimes (Campanha específica de consumo)

h) Promulgação de diplomas regionais, para obtenção de elementos estatísticos

Medidas: *Criação da obrigação dos armazenistas/exportadores, apresentarem o documento INTRASTAT de expedição no IBTAM, sendo este, posteriormente, remetido ao Serviço Regional de Estatística, de modo a que a movimentação para os Países Comunitários fique identificada. *Quanto à exportação para o Continente e Açores, prever a apresentação

do manifesto de carga, no IBTAM, antes do embarque da mercadoria.

f) Realização de Feira Regional do Artesanato

a) Criação de Centros de Formação, reciclagem e aprendizagem.

i) Redução de fretes: com contrapartida do cumprimento das medidas anteriores, criar reduções nos fretes.

j) Criação de Museu do Artesanato do Vime, congregando todo o passado e presente de tipos e modelos de obra, instrumentos de trabalho, recriação das fases do processo.

Medidas: Obtenção de espaço próprio, em exploração associativa com entradas pagas.

6. Levantamento estatístico do sector, através da Direção Regional de Estatística, para apuramento regular (anual) do sector, a vários indicadores (pessoal, rendimentos, produção, exportações).

7. Mecanismo no terreno para Controle e Certificação da Qualidade de Obra.

8.Regime de Trabalho

O atual regime laboral, prevê-se suficientes alternativas para teoricamente, enquadrar a generalidade das situações.

Contudo, uma análise real e não ficcionada, permite concluir e constatar que subscrever que neste momento estão todas as situações enquadradas é ocultar a realidade e mistificá-la.

Constatou-se que a grande maioria (1.038) dos obreiros (artesãos) estão inscritos, por conveniência e indicação como Artesãos, em regime de conta própria, pagando 5% à Segurança Social.

O remanescente é pouco expressivo, ou seja, os que estão integrados na qualidade de trabalhadores por conta de outrém, os independentes, e os trabalhadores domiciliários.

Daí a procura séria e responsável de propostas eventualmente mais ajustadas à realidade e na procura de estatutos claros e explícitos, pese a dificuldade e sujeição às críticas fáceis.

Propostas apresentadas

a) Regime adaptado de trabalho domiciliário

b) Regime jurídico do Associativismo no sector dos vimes: constituindo mais uma opção de fundo, para poder enquadrar, complementarmente outras opções laborais, pois trata-se de agregar sócios (como entidades associativas) a partir destas, formular-se uma verdadeira relação laboral: seja por conta de outrém (Associação/trabalhadores); seja trabalho domiciliário (Associação como dador de trabalho e domiciliários). Neste regime a relação laboral estabelece-se entre um dador de trabalho e obreiros.

c) Alteração ao regime de Segurança Social específico para o sector primário (Decreto Regional no 26/79/M de 7 de Novembro), incluíndo explicitamente neste, o sector dos vimes, para asssim enquadrar, noutras soluções legais, este regime de Segurança Social, muito mais favorável para ambas as partes (contribuintes/beneficiários)

d) Regime jurídico do trabalho no sector do Artesanato da obra de vimes

Com esta proposta, supostamente mais abrangente do que os demais enquadramentos jurídicos, restrito às unidades mais especificamente artesanais, daí o limite dos Artesãos por unidade a seis pessoas (incluindo os pertencentes ao agregado familiar), em contraponto, de certo modo, ao regime do trabalho domiciliário, que na proposta alterada, abrange situações de maior dimensão.

É este um dos problemas que se coloca a qualquer opção de enquadramento laboral, pois a generalidade dos regimes jurídicos, impõem regimes contributivos elevados, sendo normais para os demais sectores, assume no sector dos vimes, pela tradição e hábitos criados, e por não terem surgido soluções corretas nos momentos favoráveis economicamente, que o sector viveu outrora, neste momento de crise torna mais problemática, pois tudo o que implica aumento substancial de custos sem mecanismos compensatórios no circuito, tem pouca viabilidade prática.

Por esse facto, em todas as soluções apresentadas, no que se refere ao regime contributivo da segurança social, sempre foi ponderado regime específico, abaixo dos padrões normais.

Não sendo possível, criar regimes sem cobertura legal e em desconformidade com a lei de Bases da Segurança Social, as opções apresentadas, tiveram tal limite presente, sem todavia deixar de ter presente a especificidade regional do sector, a preocupação de salvaguarda deste, e, em todos os casos, criar um regime que, corrigindo a situação vigente - onde a maioria apenas contribui apenas com 5% por força de despacho regional - pelo que em todas as opções seria melhorada a contribuição (contribuintes e beneficiários) para a Segurança Social e com vantagens de obstar ao estado atual de significativa evasão e práticas contributivas lesivas da Segurança Social.

9. Regime da Segurança Social

Conclusões Globais

1. O Grupo, pela sua dimensão e heterogeneidade, se permitiu uma ampla abordagem desta problemática, com contributos significativos, objetivos, e importantes de alguns membros, não gerou em si próprio, nesta fase, amplos consensos nas soluções concretas, embora fosse dominante, a ideia de necessidade de modificar e melhorar a situação atual em vários domínios, como disso é expressão a variedade de propostas.

2. Existem, propostas que podem ser mais imediatamente equacionadas e outras que exigirão um apuramento de contéudo, formulação e sentido, a exigir melhor e mais detida avaliação, para condensar algumas propostas e outras aperfeiçoá-los tecnicamente.

3. A mudança equilibrada no sector passa pela adoção de medidas de apoio e alterações em todas as fases do processo produtivo, visando ganhos em vários domínios - pelos apoios, racionalização e congregação de meios, recursos e opções mais funcionais e com efeitos na produtividade e nos custos diretos para deste modo absorver algumas medidas que exijam mais encargos (remunerações e segurança social) e manter o produto final competitivo, embora tal não possa decorrer, neste atual contexto concorrencial mundial, exclusivamente com preocupações de diminuição de custos finais, mas criando em simultâneo padrões de valorização qualidade e inovação da obra de vimes da nossa Região.

4. Um dos aspetos mais complexos prende-se com o aspeto do enquadramento laboral no sector. Para além dos cenários jurídicos já existentes e que naturalmente continuam a ser opções laborais aplicáveis aos casos próprios, o que se pretende é ir um pouco além nas soluções disponíveis para um completo e pleno enquadramento jus-laboral de situações que possam persistir na ambiguidade e por isso veiculadoras de zonas cinzentas, de desconformidade legal, com prejuízos implícitos nos interessados, a exigir soluções apropriadas, exequíveis e ponderadas. Por isso todas as propostas apresentadas complementares aos regimes vigentes - nomeadamente a adaptação do regime do trabalho domiciliário (com eventuais alterações e apuros técnicos), bem como o regime jurídico do artesanato da obra de vime, permitirão, a nosso entender, abranger todas as situações verificáveis no sector e neste contexto encontrar-se soluções para todas as situações, na perspetiva de melhoria geral das condições de trabalho do sector e na clarificação dos vínculos laborais emergentes.

Entendemos que haverá que criar o devido enquadramento laboral, avançar para a melhoria da atual situação e nesse sentido, existem bases de trabalho suficientes para esse objetivo, que é essencial e histórico.

5. Nestes termos, e como sugestão prática consideramos útil e necessário para o aprofundamento dos trabalhos desta Comissão tripartida, a constituição de Grupo de trabalho restrito com 5 elementos, do Trabalho, do IBTAM, do Sindicato, da ACIF, e da AFAVIMES para a elaboração de propostas síntese e concretização das medidas sugeridas no conjunto vasto elenco de propostas, em causa, assim como das condições objetivas para a execução destas.

6. O grupo de trabalho que ora conclui a sua participação e contributo abriu caminhos, gerou todo um vasto acervo de análises, documentos e propostas, que tornará facilitado decerto, todo o trabalho subsequente, que será mais de pormenor, de lapidação, que de conteúdo geral.

Funchal, 26 de Maio de 1997

O Presidente do Grupo de trabalho e relator, Rui Gonçalves da Silva

Nota: Posteriormente o Decreto Legislativo Regional n.º 16/2003/M de18 de julho, ao Regulamentar a atividade artesanal da obra de vimes na Região Autónoma da Madeira, acolheu algumas das propostas no estatuto do artesão e no seu regime laboral.

Conclusão

O sector da obra de vimes, teve um percurso sinuoso, de momentos de afirmação, exuberância e fulgor, com outros períodos de declínio e de crise, vivendo no presente dificuldades acrescidas, numa atividade residual e tendencialmente a extinguir-se, com o encerramento das principais empresas produtoras/exportadoras e abandono da atividade por muitos artesãos, apesar de se constatar projetos que ainda persistem e dão algum alento para o futuro, desde que devidamente apoiados.

Somos dos que acreditam na viabilidade dos sectores que integram a génese, a tradição e a cultura da Região, pois para além da sua dimensão social e económica, existe essa marca de valores de referência e que identificam um povo, na sua história e afirmação, esse património que supera as crises e os constrangimentos ocasionais, desde que exista empenho, vontade e determinação de superar tais vicissitudes.

No caso do sector da obra de vimes, existe essa ligação forte à tradição, à vida e história da Região, desde o apogeu desta atividade, cujas obras são referências no País e por esse mundo, mas que tendem a perder-se, pela crise que ora enfrenta, que vem dos anos 90 e que se agudizou progressivamente até aos nossos dias, num declínio constante, mas que poderá ganhar novos rumos se existir conjugação de vontades e esforços, com a adoção de medidas concretas e ajustadas aos novos desafios, que possibilite o renascer desta atividade, certamente com outros processos e outra dimensão, mas que dê alento e vida para que a obra de vimes – retomando ideias e projetos e assumindo outros - não cesse e readquira, pelo menos parte que seja, do valor e importância que teve no passado e possa se afirmar no mercado atual e futuro, no contexto dos produtos viáveis e sustentáveis, pois expressam, o engenho e habilidade, de quem faz de rebentos de um simples arbusto (o vimeiro), autênticas e verdadeiras obras de arte, que incorporam a natureza e nela a alma, o labor e o sentir dos seus obreiros e a identidade de uma Região.

Nota: este apontamento é, a seu modo, uma singela homenagem a todos quantos, no passado, se dedicaram ao engrandecimento desta atividade e aos que no presente, herdeiros dessa tradição, tudo fazem para mantê-la viva e honrar esse compromisso histórico, de legarem às gerações futuras, este nobre património, símbolo e referência desta Região.

Funchal dezembro de 2020

*Rui Gonçalves da Silva/ Madeira